Circula há muito tempo no Brasil a versão de que as cores
verde e amarelo, da bandeira, seriam as cores de duas casas reais, os Orléans e
os Bragança. Trata-se de uma tentativa de adivinhar o pensamento de dois gênios
– Jean-Baptist Debret e José Bonifácio. Enquanto historiografia, é lamentável,
uma explicação simplória, limitada ao pensamento de grandes personagens.
O verde e o amarelo não são as cores nacionais brasileiras
porque Debret e José Bonifácio escolheram, nem é possível adivinhar o que eles
realmente pensavam, se escolheram pelos mesmos motivos, se só tinham um motivo
para cada cor, e nem nada disso interessa.
O verde e o amarelo se tornaram as cores nacionais porque
foram repetidamente usadas pelo Partido Brasileiro. Os defensores das casas
Bragança e Orléans usavam outras cores, de novo, a despeito do que pensassem
Debret e José Bonifácio.
O Partido Português, defensor da unidade do Brasil com
Portugal sob a coroa dos Bragança, usou o azul e branco enquanto essas foram as
cores portuguesas, e com a volta do absolutismo de D. João VI, mudaram as cores
portuguesas para verde e vermelho, e no Brasil os inimigos da independência
passaram a usar verde e vermelho.
O povo brasileiro adotou com facilidade o verde e o amarelo
porque foi fácil usar a vegetação para fazer enfeites com essas cores. Em Minas
Gerais foi comum usar o tabaco para fazer o amarelo.
No dia 7 de setembro de 1822 uma frase atribuída a D. Pedro
I é tomada por metafórica, mas ela foi bem literal – Quando percebeu que teria
que escolher entre obedecer Lisboa ou ao Partido Brasileiro, e decidiu-se pela
independência, ele teria dito “laços fora”. Estava ordenando aos membros da
comitiva que jogassem no chão as fitinhas azuis e brancas que simbolizavam
Portugal.
Desde 1822 até 1831, o verde e o amarelo disputaram as ruas
com as cores portuguesas. Cada vez que se sentia ameaçada a independência, os
seus defensores estimulavam o uso do “laço nacional” – os homens usavam quase
sempre nas lapelas ou nos chapéus, e as mulheres no pescoço ou como pulseiras,
fitinhas verdes e amarelas.
Consolidada de independência política, o verde e o amarelo
estiveram presentes em todas as lutas do povo, nos momentos bons e nos ruis.
Não existiu grande revolta que não levantasse as cores verde e amarelo.
É verdade que essas cores foram usadas em massacres no
Paraguai, mas também é verdade que foram usadas contra os nazistas na Europa. É
verdade que se sujaram nos navios negreiros, mas também foram usadas pelos
abolicionistas. Foram usadas pelos golpistas de 1964, mas também foram usadas
tanto pelas Diretas Já quanto pelos diversos movimentos de resistência à
ditadura.
Desde 1831 várias bandeiras habitaram o coração do Partido
Português – a lusa, a inglesa, a francesa, e atualmente a estadunidense. Mas
como até eles sabem o quanto é indecente essa fidelidade a chefes estrangeiros,
passaram a tentar roubar as cores brasileiras. Trata-se do único traço de
nacionalismo dessa gente. São defensores de doar tudo que é nacional aos seus
amores estrangeiros, sob os nomes de “privatização”, “abertura econômica”,
“investimento estrangeiro” etc.
O domínio da burguesia estrangeira sobre o povo do Brasil é
tamanho que grande parte desse povo, mesmo sendo hostil ao Partido Português,
não se torna decididamente Brasileiro. Aí estão as manifestações contra
Bolsonaro, e alguns dos seus organizadores nitidamente não têm nenhum apego à
bandeira brasileira. São defensores de justiça social, de direitos humanos,
alguns se acham até socialistas, mas não entendem que nada disso se faz sem
liberdade das nações umas perante as outras. Esses não-brasileiros se acham
internacionalistas, mas querem uma Internacional sem nações... Extinguir as
nações é genocídio. Seria necessário extinguir línguas, tradições, receitas
culinárias, músicas, culturas inteiras. Internacionalismo não é extinguir as
nações, é uni-las e deixar que se fundam se e quando isso acontecer. É defender
é autodeterminação de cada uma delas, ou seja, é defender a independência de
cada nação, a começar pela nossa, que não está livre.
No futuro podemos conquistar a sociedade sem fronteiras, em
que as nações não sejam mais que curiosidades regionais, quando não existirem
mais classes e Estado, o que Marx chamava de comunismo. Hoje, porém, o
socialismo só é possível onde existe pátria livre. Sem pátria, não existe
socialismo, no presente.
Ademais, sem pátria, não existe sentido na coisa pública. O
patrimônio público só tem sentido se esse “público” existir no pensamento das
pessoas, ou seja, se existir, para elas, uma pátria. Atualmente, o bem comum
exige uma pátria livre.
Ao invés de atacar as cores nacionais, que está no coração
do povo, o que devemos fazer usar as cores nacionais para levar a esse povo o
apego a coisas realmente importantes para a nação. Devemos tornar o povo
realmente nacionalista, explicando detalhada e pacientemente os interesses
nacionais em seus vários aspectos.
Ao invés de fazer com o Partido Português uma guerra de
símbolos, em que ele usa só a nossa bandeira, consolidada e amada pelo povo, e
nós usamos enorme diversidade de bandeiras, o que é em si uma derrota dos
brasileiros para os estrangeiros, o que devemos fazer é discutir com eles quem
é mesmo nacionalista. Se eles roubam as cores brasileiras, que detestam, é
porque precisam. Portanto, denunciar que as políticas deles são de traição à
pátria os destrói.
O crescimento do número de bandeiras brasileiras nas
manifestações contra Bolsonaro significa, para quem assiste, que mais povo
brasileiro de verdade está participando. Se só existem bandeiras partidárias,
as pessoas avaliam que só estão presentes os militantes, que portanto estariam
isolados. A exclusividade de bandeiras partidárias também gera desconfiança
sobre intenções eleitoreiras e proselitistas. Ademais, confirma as mentiras dos
bolsonaristas, que assim, com ajuda dos muito “inteligentes” inimigos da
bandeira do Brasil, conseguem manter a imagem que querem manter.
Quando o laço nacional se espalhar pelos mastros das
bandeiras vermelhas, laços vermelhos começarão a se espalhar pelos mastros de
bandeiras do Brasil.
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