No Brasil o voto é obrigatório desde a independência, em 1822. É curioso que a esquerda em sua maioria defenda tal obrigatoriedade como democrática. Seria algo politizador e uma garantia da participação popular. Os defensores de esquerda do voto obrigatório têm o hábito de iniciar suas argumentações com um discurso sobre a miséria do povo. A miséria e ignorância do povo justificariam obrigar esse mesmo povo a votar. A direita, que sempre dominou o parlamento, e sempre manteve o voto obrigatório, é que estaria enganada, ou pensando no bem do povo? Os senhores de escravos do Império, as elites políticas da República velha, Vargas, as duas ditaduras do século XX, todos mantiveram o voto obrigatório.
Se o voto obrigatório fosse politizador, nosso povo já estaria politizado por duzentos anos de sua imposição. O voto era tão obrigatório nos primeiros anos de nossa independência, que até 1841 o votante podia enviar seu voto por meio de outra pessoa, mas não podia deixar de votar, sob pena de multa. A obrigatoriedade é despolitizadora. Ela desvaloriza o voto, tanto no sentido psicológico, quanto no sentido de aumentar a oferta de votos. Os despolitizados vão votar, para não terem que pegar fila para pagar os 5 reais de multa, e votam mal, e isso desmoraliza as eleições, o que é despolitizador. Gente politizada deixa de votar como protesto ou por não ter candidato que preste, o que não teria sentido se o voto fosse livre.
A participação popular obrigatória não é democrática. O povo nunca mandou em nada por ser obrigado a votar. São os políticos que ficam mais fortes, legitimados por mais votos, de gente que não sabe em que votou. O povo ainda se sente culpado, pois sempre conclui que votou errado, como se mandasse mesmo em alguma coisa. O voto obrigatório não aumenta o poder, mas aumenta o sofrimento psicológico do povo. A culpa da corrupção não seria dos corruptos, mas do povo que vai votar na marra, e a própria desigualdade social seria culpa desses ignorantes. O cara nasce pobre, é educado pela TV e por igrejas, e ainda seria culpado por ser feito de trouxa.
Mas o pior do voto obrigatório é que barateia e facilita a compra de votos. Quem defende o voto obrigatório diz o contrário, por não pensar nem um pouquinho. Com o voto obrigatório os compradores de voto saem distribuindo dinheiro e favores, sem pedir nada. Como o voto é obrigatório, grande parte das pessoas que receberam qualquer porcaria, despolitizados, sem candidato, votam no candidato que lhes deu dinheiro, ou até pinga. Como o candidato não pede, não é possível acusá-lo de compra de votos. Muitos desses eleitores nem sabem que venderam seus votos. Acham que estão votando por gratidão.
Claro que existe a compra explícita, em que o comprador pede o voto em troca seja lá do que for. Continua sendo mais barata pelo voto ser obrigatório. Questão de oferta e procura. Já com o voto livre, a compra vai ficar mais cara e perigosa – vai ser necessário dar até transporte e lanche, o que facilita pegar os criminosos. Com menor oferta de votos, os compradores vão precisar correr atrás dos eleitores, ir atrás deles no dia das eleições, oferecer mais.
As pessoas que vão deixar de votar, certamente são as despolitizadas, que são as que se vendem barato. Por mais dinheiro que os compradores de voto gastem, não conseguirão o mesmo número devotos que conseguem hoje, porque seus clientes estarão na praia, em churrascos, viajando etc. Ademais, algumas pessoas que vedem o voto sem saber que estão vendendo, não venderiam sabendo. São as que não vão nem se lembrar do dia das eleições.
A maioria de direita no parlamento sempre foi feita de votos comprados. As pesquisas indicam que 60% dos eleitores afirmam não se lembrar em quem votaram, e quase ninguém confessa que vendeu o voto. Esses 60% são eleitores que venderam seus votos, sabendo disso ou imaginando que estão votando por gratidão.
O fim do voto obrigatório fortalece o eleitor politizado, e enfraquece os políticos mais criminosos. Das reformas políticas necessárias, é a mais fácil, pois tem apoio de mais de 80% da população.
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